terça-feira, 26 de outubro de 2010

Eleições e a Agricultura Familiar

Publicamos abaixo mais uma manifestação respeitosa, baseada em experiências reais do cotidiano da Cooperativa da Associação dos Agricultores Ecológicos das Encostas da Serra Geral. Recebemos esta mensagem porque somos clientes da Cooperativa na compra de produtos orgânicos, e consideramos um importante testemunho que pode contribuir com o deslocamento do debate infrutífero para um debate de idéias que interessam à nossa sociedade.


Caros clientes da CooperAgreco,

Pedimos desculpas pela ousadia, mas consideramos necessário incluir na cesta desta semana, junto com o sabor de nossos produtos, este texto que traz reflexões de quem tem lutado para produzir alimentos limpos e saudáveis para você e sua família, assim como para construir uma sociedade brasileira que respeite a natureza e os homens e mulheres do campo.

Estamos, neste momento, vivendo um processo eleitoral que julgamos decisivo para a definição do ambiente político-institucional em que atuamos. Por isso, temos acompanhado com muito interesse as discussões sobre a eleição presidencial. Temos feito isso em contato com nossos representantes de vendas, com compradores de supermercados, com consumidores finais, nos restaurantes em que nossos produtos são servidos, e, de forma geral, por todos os lugares urbanos em que passamos.

Percebemos, em boa parte dos casos, que as opiniões estão sendo formadas sem considerar as políticas públicas voltadas à agricultura familiar e, especialmente, à agricultura orgânica. Ora, mas são essas políticas que nos afetam diretamente e que tornam possível, ou não, aumentarmos e melhorarmos a produção do que levamos as suas casas e mesas. Passamos a perceber que, na cidade, essas políticas são, contudo, muito pouco visíveis.

Por este motivo, pensamos ser importante indicar a você, caro cliente cidadão (no duplo sentido de “habitante da cidade” e “indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos”), como vivenciamos as políticas federais que afetam o campo nos últimos oito anos (Governo Lula).

Se, hoje, somos uma rede de mais de 300 famílias de agricultores das Encostas da Serra Geral, é porque tivemos, ao longo desse período, grandemente ampliadas as oportunidades de produção e comercialização de alimentos orgânicos.

Esse avanço foi possível com o auxílio de diversos programas do Governo Federal. Os dois principais: o PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar e o PAA - Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, que garantiram crédito e canais institucionais de comercialização para que pudéssemos expandir nossa produção e aumentar o número de agricultores familiares convertidos à produção orgânica.

A continuidade desses programas parece óbvia. Mas, não é! Exige compromisso com um modelo de desenvolvimento sustentável e com uma perspectiva de fortalecermos um Brasil rural com gente. Muita gente. E vivendo feliz, criando aí seus filhos e netos.

Pois bem, nossa experiência mostra claramente que esse compromisso existe apenas na candidata da Coligação “Para o Brasil seguir mudando”, Dilma Roussef. A outra candidatura aponta, ao contrário, para a descontinuidade, com uma ruptura com os princípios dessas políticas, seja em função de suas próprias opções, seja em função dos compromissos que já assumiu com os grandes produtores do agronegócio.

A CooperAgreco, juntamente com a Associação dos Agricultores Ecológicos das Encostas da Serra Geral (Agreco), tem o sonho de ter nessa região, rica em nascentes d’água, remanescentes da Mata Atlântica e agricultura familiar ainda “colonial”, um território sustentável que garanta a qualidade desses recursos naturais e a dignidade do seu povo. Ela quer concretizar esse sonho e sabe que isso exige, por mais tempo, o apoio de políticas públicas diretamente voltadas à agricultura familiar orgânica.

Foi considerando sua preferência por nossos produtos e sua confiança em nossa postura ética, tanto na produção dos alimentos que você dá aos seus filhos, quanto na construção de um mundo melhor que também será para eles, que julgamos possível e adequado fazermos essa manifestação.

Muito obrigado pela compreensão e pelo apoio.

CoperAgreco.

Eleições e as pessoas com deficiência


Transcrevo abaixo mensagem que recebi do meu amigo Adriano H. Nuernberg, professor do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina e pesquisador nas áreas de Psicologia Escolar e Educacional e Estudos sobre Deficiência.

Meus amigos,

Estamos a ponto de realizar a escolha entre os candidatos à presidência do nosso país e creio que todos desejam fazê-la com base em argumentos consistentes.

Não estou aqui para satanizar ou idealizar nenhum candidato, mas apenas apresentar um argumento pontual, pertinente à minha área de trabalho como professor e pesquisador, que contou para que minha opção fosse pela candidata Dilma Rousseff (PT).

Nos últimos anos vimos os maiores avanços na inclusão das pessoas com deficiência no país, em todas as esferas: trabalho, educação, saúde, assistência social.

Também foi durante o governo Lula que se aprovou, com a agilidade merecida, o mais importante documento para a defesa dos direitos das pessoas com deficiência, a Convenção Internacional pelos Direitos da Pessoa com Deficiência, promulgada pelo presidente em 2008.

Por sinal, essa Convenção foi amplamente criticada por alguns membros do PSDB que são muito influentes na Educação Especial brasileira, como Eduardo Barbosa ( do PSDB-MG que também é presidente da Federação Nacional das APAEs).

Avaliando as propostas de ambos os candidatos, fica claro que Serra, que conta com o apoio das APAEs, acena para o reforço de uma política segregacionista que historicamente se perpetua no país.

Ademais, tenho estado atento ao modo como Serra se refere às pessoas com deficiência, em grande parte das vezes evidenciando uma noção pautada pelo modelo médico e a assistencialista da deficiência.

Para mim, Dilma representa a continuidade do reforço dos mecanismos democráticos como as Conferências pelos Direitos das Pessoas com Deficiência, que levam a voz desse grupo social para as decisões quanto às políticas públicas dessa área, pensando a Deficiência como um tema transversal a todas as esferas, da Educação, ao trabalho, à Assistência, e o fazendo a partir de um modelo social da Deficiência.

Serra, ao contrário, reforça a lógica do especialismo e da segregação, ao propor o “Ministério da Pessoa com Deficiência”.

Não se enganem: as pessoas com deficiência não querem nada especial, nem Estatuto, nem Ministério só para elas, mas sim, ver seus Direitos Humanos reconhecidos, como nosso atual presidente tem sido capaz de reconhecer nesses anos, situando a Coordenadoria que trata das questões desse grupo social na Secretaria de Direitos Humanos e enfrentando a questão das barreiras às pessoas com deficiência em todos as áreas, transversalmente.

Enfim, existem vários outros motivos que pautam minha escolha por Dilma, dentre eles estão aqueles que a ilustração neste link descreve. Aqui desejei apenas acrescentar outro motivo que pode ser considerado em suas escolhas.

Abraço a todos e obrigado pela atenção.

Adriano H. Nuernberg

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A vitória de ontem

Por Alexandre Francisco Cavallazzi Mendonça

Ouso dizer que o Avaí começou ganhando o jogo! Ganhando?! Sim, ganhando ainda no ônibus, quando passou pela torcida apaixonada, uns com faixas, cartazes e bandeiras, outros com fogos, sinalizadores, tambores e cornetas, mas todos com sangue nas veias, pulmões na garganta e lágrimas nos olhos.

Ali naquele momento, a Ressacada voltou a pulsar. Tal como um desfibrilador, cada grito, cada espocar de um foguete era como um choque no coração do Leão. Aquele tiro que tomamos no primeiro minuto parecia ter nos atingido em cheio, tanto que sangramos por cinqüenta minutos. O Leão por um momento havia esquecido que vestia um escudo azul.

No intervalo, aquelas ações da torcida começaram a fazer efeito. Os jogadores viram que deviam fazer mais e melhor. E, fizeram. Na primeira estocada, o inimigo acusou o golpe e o Coração Azurra aumentou o ritmo das batidas. Veio o segundo seguido de êxtase e o terceiro sem adjetivos. O Leão respirou o ar que saia dos pulmões da torcida, como numa respiração boca a boca.

A batalha estava de novo nas patas do Rei da Ilha, mas longe de terminada. Das arquibancadas eram fornecidos o oxigênio o sangue e o soro, do lado do gramado, gandulas, jogadores reservas, o técnico e demais integrantes do banco eram os auxiliares de enfermagem, cada um cumprindo seu papel. Do lado de fora, alguns abutres até sobrevoavam fazendo questão de lembrar que o Leão costuma tomar um tiro no final das batalhas, repetindo aquilo como um mantra, na esperança que essa desgraça se repetisse.

Encerrada a batalha, o animal estrangeiro estava definitivamente abatido em terras sagradas e o Leão, Rei da Ilha, ferido, mas vitorioso, desabou ao chão num gesto que demonstrava muito mais do que imaginamos. Ao fim daquela luta, gramado ao qual os Jogadores se entregaram exaustos, transfigurou-se de campo de batalha em braços da torcida. Cada torcedor estendeu seus braços e amparou o Leão exausto, mas não abatido; ferido, mas não morto.

O que vem depois, só interessa ao depois, hoje o coração pulsa com mais vigor, com mais sangue e com mais oxigênio. A ferida ainda não está curada, mas o remédio e o tratamento não podem parar.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Um Vereza e um apedeuta...

Eu tenho um problema. Às vezes eu encasqueto com uma coisa, e meu lado chato não me deixa em paz enquanto não vence a batalha.

Querem um exemplo recente?

Trata-se de um vídeo que está no youtube, com uma entrevista do ator Carlos Vereza no Programa do Jô, em que ele faz um apaixonado discurso com veementes críticas ao Partido dos Trabalhadores, e rasga elogios quase orgasmáticos ao José Serra.

Até aí nada de mais. Está no seu direito. Jô também tem esse direito de fazer do seu programa um espaço anti-petista, com as suas meninas tucanizadas travestidas de comentaristas políticas. Tudo normal até aí.

O que me deixou intrigado é uma informação que vem com o vídeo, de que esta entrevista teria sido "censurada" pela Globo e pelo PT devido ao forte tom de acusação do ator global, o que causa um enorme alvoroço nas hostes anti-petistas sempre à espera de algum fato que finalmente sirva como prova cabal que o Brasil vive um regime ditatorial.

Obedecendo meu lado chato, resolvi tirar a dúvida diretamente com o principal protagonista. Fui ao blog do ator, peguei seu e-mail e escrevi diretamente a ele. As mensagens seguem abaixo:

Primeiro e-mail:

15 de outubro de 2010 01:12
De: jd
Para: carlosvereza@hotmail.com

Prezado Carlos

Peço licença a você para lhe fazer uma pequena pergunta: é verdade que a sua entrevista no Jô Soares foi censurada?
Atenciosamente,
João David
Florianópolis - SC

Resposta do ator

15 de outubro de 2010 04:26
De: Carlos Vereza
Para: jd

Mas não pelo Jô! Coisas do PT! Um abraço. Carlos Vereza.


Minha nova mensagem ao ator

15 de outubro de 2010 14:11
De: jd
Para: Carlos Vereza

Caro Carlos Vereza
Muito obrigado pela atenção e pela rápida resposta.
Mas ainda não ficou claro para mim: o programa foi ao ar ou foi vetado pela Globo?
Desculpe pela insistência.
Agradeço mais uma vez sua atenção.
Forte abraço
João David




Enquanto escrevo este post, continuo aguardando a resposta do ator global. 

Provavelmente, a vida atribulada de uma personagem tão relevante da tv brasileira não permite que ela tenha tempo a perder com pessoas desconhecidas que ficam obedecendo ao seu lado chato, importunando atores em busca de esclarecimentos sem a menor importância.


Imagino ser esta a explicação para o caráter vago e impreciso de sua primeira resposta, e para o silêncio após a minha nova pergunta. 


Portanto estaria tudo bem comigo, não fosse esse meu lado chato - ele de novo? - ficar sussurrando em minha mente a idéia de que se o ator não quis me responder de forma clara, é porque talvez ele tenha interesse em que esta história continue com este enredo, o de um partido que censura as opiniões contrárias.

E o pior: este lado chato descobriu na internet a informação de que a dita entrevista foi ao ar no dia 06 de maio de 2006, o que aumentou a minha dúvida sobre se não teria sido bem mais simples se o ator respondesse que não, a entrevista não foi censurada.


Ou talvez eu não tenha entendido mesmo a sua primeira resposta porque sou um simples apedeuta.


Diante desta situação, só me resta esperar. Ainda prefiro acreditar que ele apenas não teve tempo para me responder.

domingo, 17 de outubro de 2010

Bloguilhéu abre o voto

Meu voto é cheio de ressalvas e críticas, mas voto para evitar um mal pior: o retorno do PFL/PSDB/VEJA ao comando do país.

Não porque eles comem criancinhas, são do demônio, fazem abortos e fecham igrejas, ou outras tantas asneiras que andamos ouvindo por aí, mas porque acredito que o seu projeto político foi e é prejudicial ao país.

Só isso.

A plena democracia é assim, liberdade para pensar e escolher.

É apenas a minha opinião. Não é melhor nem pior que a dos outros.

E que no dia 31, caibam todas as livres opiniões nas urnas deste país...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O Ato falho de Serra, O Estadão e Freud

Certas canções que ouço cabem tão dentro de mim, que perguntar carece: como não fui eu que fiz? (Milton Nascimento)

Seguindo o princípio do Milton, há certos textos que eu leio que se encaixam tão bem com meu pensamento, que o melhor a fazer é nem tentar reescrever as idéias; e somente copiar literalmente.

É o caso deste artigo que acabo de ler no blog  O Escrevinhador e transcrevo para o conhecimento dos leitores e amigos do Bloguilhéu:

O Ato falho de Serra, O Estadão e Freud
por Rodrigo Viana


Como sabem aqueles que conhecem um pouquinho de Freud, os atos falhos são – por definição – reveladores daquilo que anda em nosso inconsciente, e que muitas vezes tentamos esconder.

Quando alguém vai ao psicanalista, às vezes passa horas e horas tentando explicar o que pensa e o que sente. Discurso controlado, consciente – e que no mais das vezes encobre a verdade.

Um ato falho, que o paciente deixe escapar em meio a dezenas de sessões, às vezes dá uma pista mais importante para o psicanalista do que horas e horas de blá-blá-blá. O ato falho revela o que está reprimido, e pode apontar o longo caminho da cura (ainda que – quase sempre – a cura não seja a felicidade absoluta, mas a infelicidade suportável).

Vejam se não é um ato falho maravilhoso esse cometido por Serra hoje, ao falar do aborto: “Estão querendo tirar o aborto da pauta. Eu nunca disse que sou contra o aborto, porque sou a favor o aborto”, disse primeiro Serra, para surpresa da plateia. “Ou melhor, sou contra o aborto”, corrigiu em seguida.” A notícia eu li aqui.

Não é sensacional?

A campanha de Serra foi a beneficiária do terrorismo religioso envolvendo o aborto na reta final da eleição. Ou vocês acreditam que essa história tenha sido um debate que surgiu “naturalmente” na sociedade? O Paulo Moreira Leite – jornalista que trabalha na revista “Época”, mas que tem a qualidade de não brigar com os fatos – acha que não. Confiram aqui o que diz o Moreira Leite sobre isso.

Mas, de volta ao ato falho…

Serra, como sabemos, não é um homem formado nas tradições da direita. Isso é que é mais triste. Se fosse o Alckmin, que milita na Opus Dei, a gente entenderia. E até respeitaria mais – porque a Opus Dei é visceralmente contra o aborto.

Mas o Serra não vem dessa tradição conservadora. Está apenas usando esse discurso – de forma hipócrita, desavergonhada, sem nenhuma convicção.

Pra espalhar o medo e a boataria sobre aborto, Serra precisa reprimir o que ele mesmo – no íntimo – deve pensar sobre o fato. Tanto que – quando ministro – o tucano corretamente assinou uma portaria regulamentando o aborto no SUS.

Por que Serra fez isso? Porque é um malvado assassino de crianças? Não. Porque é o mais razoável. E porque o PSDB – por mais críticas que se possa ter ao programa político e econômico do partido – nunca foi uma legenda obscurantista. Não é essa a tradição de FHC, Covas, Montoro.

É por isso que o ato falho fez-se presente. Revelou a hipocrisia, revelou o que Serra gostaria de manter escondido.

Não sou psicanalista. Talvez Maria Rita Khel, que é psicanalista, pudesse escrever sobre esse magnífico ato falho. Isso se o “Estadão” não tivesse vetado textos dela com conteúdo político. É que a Maria Rita Khel não segue a linha do jornal – que apóia o tucano.

Serra dizer “sou a favor do aborto” é um ato falho tão revelador como o “Estadão” (tão preocupado com a “liberdade de expressão” sob ameaça do “lulo-petismo”) dizer à Maria Rita: “não escreva sobre política”.

A direita vem à tona. À tiracolo traz preconceito, hipocrisia, caça às bruxas.

É como se o segundo turno – tão comemorado como oportunidade de “qualificar o debate” – levasse o Brasil não para o futuro, mas de volta para os séculos XVI ou XVII. Naquela época, a Inquisição podia prender, interrogar, torturar e – no limite – executar aqueles que se afastavam da “verdade de Deus”.

O obscuratismo insuflado pelos tucanos leva-nos de volta a esse caminho. A Inquisição já não há. Mas o desejo inconsciente de prender, interrogar, torturar e executar segue a habitar os recantos das mentes mais conservadoras.

O debate sobre o aborto é necessário. E pode ser feito de forma séria. Mas os tucanos querem o boato, o medo. Jogam no lixo a história de um partido que nasceu para “modernizar” a política brasileira – lembram? Mas que agora se afunda, de braços dados com a pauta da extrema-direita religiosa.

Por que Serra aceita esse papel?

Freud talvez explique.


[Fonte: blog O Escrevinhador]

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Comentário sobre os comentários


Caros amigos e leitores

Estou muito feliz pela positiva repercussão do artigo publicado no post anterior, não apenas entre os evangélicos, mas entre muitos outros que se identificaram com as idéias contidas no texto, independente de bandeiras e crenças religiosas.

O número de acesso ao Bloguilhéu nestes dois dias triplicou, e além dos vários comentários no próprio blog, recebi uma grande quantidade de e-mails de muitas pessoas comunicando-me que o texto estava sendo reenviado às suas listas de contato. 

Agradeço a todos pelas belas palavras de estímulo escritas nos comentários.

Quero comentar a ótima contribuição do Wolney, dizendo que sim, concordo plenamente que a boataria extrapola as portas das igrejas evangélicas e alcançam os mais diferentes lugares e credos, o que deve entristecer qualquer cidadão que tenha o mínimo de consciência ética.

Fico honrado em saber que este texto está sendo copiado e enviado adiante, o que obviamente muito me alegra.

Quem sabe - não custa sonhar - com estas palavras sendo espalhadas por aí, pessoas possam ouvir o murmúrio de uma brisa suave trazendo mudanças, abrindo-lhes os olhos e dando coragem para sair de suas cavernas de alienação e inércia, como Elias no Monte Horebe (1 Reis 19). 

Reconheço - sou realista - que o texto está longe de obter a mesma força e velocidade de um boato mal intencionado, mas ao menos pode servir como um singelo sinal de que ainda há nesta terra muitos cujos joelhos não se dobraram diante de determinados altares.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Eleições presidenciais: os evangélicos e o mar de boataria

Caros irmãos

Não está fácil assumir ser evangélico nos dias atuais. Por causa de alguma perseguição religiosa? Não. Por causa dos próprios evangélicos.

Explico-me.

O que eu vejo acontecer dentro do território evangélico nestas eleições presidenciais tem me causado uma mistura de indignação, vergonha, constrangimento e nojo.

Não quero generalizar, é claro, mas fico impressionado com o alto grau de preconceito, de ingenuidade, ou - o que mais me assusta - com o alto grau de perversidade que tem marcado a participação de uma parcela evangélica no processo eleitoral.

Perturbo-me com a capacidade que um boato tem de se instalar e se propagar por entre as fronteiras evangélicas.

Poucas vezes vi tanta perversidade.

Maldade mesmo.

Ingenuidade às vezes. Será?

Um evangélico deveria ser prudente como uma serpente (Mt.10:16), e não a própria serpente. Descubro entristecido que em nosso meio há muitos que “aguçaram a língua como a serpente; o veneno das víboras está debaixo dos seus lábios” (Sl.140:3).

Outros há que deixam-se ser picados por serpentes. E repassam o veneno.

Veneno impregnado de preconceito e cólera.

Dilma é lésbica. Espalham um e-mail possivelmente falso de uma suposta ex-amante. Ninguém consegue encontrar a mulher; o advogado citado no texto não existe, não tem nem registro na OAB. Não interessa, o importante é passar a informação adiante, verdadeira ou falsa.

Dilma disse em Minas Gerais que nem Cristo tira dela a vitória. Chuvas de mensagens repassadas com esta “blasfêmia”. Mentira. O jornal Estado de Minas, que faz parte do Grupo Diários Associados, informou que a suposta declaração não existiu. A candidata não teria dito aquela frase em comitê algum de Minas. Mas não interessa, o importante é passar a informação adiante, vedadeira ou falsa.

Dilma vai fechar as igrejas. Reedição da velha ladainha de tantos anos, desde que Lula foi candidato pela primeira vez. Com alta porcentagem do “voto evangélico”, elegeu-se Collor, que realizava sessões de umbanda nos porões da Casa Presidencial, e todos sabem o que aconteceu.

Dilma matou pessoas. Guerrilheira, pegou em armas, é uma pecadora da mais alta periculosidade. Informação fora de contexto, que só quem sabe o que é uma ditadura compreende. Mas a idéia de uma mulher terrorista cabe muito bem a quem quer impor medo aos incautos. E a claque evangélica aplaude, regozija, e passa adiante - e radiante - a informação. Mentira? Verdade? Não importa.

Dilma é a favor do aborto e dos homossexuais. Como se nenhum outro candidato fosse. Como se estivéssemos decidindo uma eleição para presbítero ou diácono. Como se Serra e Marina fossem missionários evangélicos lutando pela implementação dos preceitos bíblicos em cada casa no país. Como se não houvesse, em todos os partidos políticos, sem exceção, integrantes alinhados com causas sociais complexas, que alguns evangélicos insistem em reduzir ao simplismo de ser contra ou a favor. E aqui evangélicos unem vozes com a força retrógrada da CNBB, num raro ecumenismo contra um mal pior: a desigualdade social? não, o PT.

O PT é o representante do império da iniquidade. Sim, e os quinhentos anos de massacre da dignidade humana e injustiça social que vieram antes do PT foram o quê, o Paraíso?

Dilma é mulher, e não deve ter autoridade sobre o homem. Portanto, não pode ser Presidente. Não, não é piada, eu li isso de verdade, e fico constrangido em admiti-lo. Não é preciso comentar. Qualquer evangélico que concorde com esse pensamento obtuso certamente nem chegará comigo à leitura deste trecho - já me abandonou nas linhas acima.

Uma tal VINACC – Visão Nacional para a Consciência Cristã - da qual eu nunca havia ouvido falar, entra em ação e elabora uma “carta aberta para a sociedade brasileira”, “alertando quanto a votar nos candidatos dos seguintes partidos: PT, PCB, PV, PDT, PSTU, PC do B, PSOL e PCO.” A voz de comando é seguida a risca por alguns, tal qual mandamento extraído do Decálogo.

Pastores terroristas - muitos ligados a partidos de direita - vociferando de seus púlpitos ameaças e mais ameaças às suas apavoradas e perdidas ovelhas que não conseguem pensar por si mesmas, que no afã da busca pela liberdade em Cristo, encontraram a escravidão hipnotizante dos lobos vestidos com pele de cordeiro.

Não tenho problemas com quem vota no Serra por questões ideológicas, por juízo próprio, por diferenças de visão de mundo, por maneiras diferentes de entender o papel político, por programas de governo, por preferências partidárias, por convicções pessoais. Ao contrário, admiro quem tem opinião própria. Não brigo nem discuto com ninguém quando se trata de convicções político-partidárias - já fiz isso quando era mais jovem e não trouxe benefício algum. Aprendi com a maturidade - acho eu - a não defender político, porque amanhã eles certamente irão me decepcionar, fazer algo contrário ao que dizem hoje, e eu fico sem meus preciosos amigos que perdi nas discussões. Nenhum político vale o preço de uma amizade.

Meu problema também não é com os que, por razões pessoais, odeiam o PT e tudo que vem dele, independente do que seja. Nunca verão nada de positivo. Nenhuma possibilidade de abrandar suas críticas. Mas democracia é isto, estão todos no seu legítimo direito. E o partido, diga-se de passagem, oferece sua generosa parcela de contribuição.

Meu problema é com aqueles que, sob o disfarce de espiritualidade, exercitam o que há de pior no mundo das trevas, à base de blasfêmia, falsa acusação e calúnia.

Minha dificuldade é com aqueles que, sem perceber sua postura de ingenuidade e alienação, viram massa de manobra política nas mãos de líderes inescrupulosos.

E meu problema é com os que plantam e alimentam preconceitos, e não hesitam em lançar mão de meios desleais para impor suas convicções.

Não escrevo em nome de nenhum grupo evangélico.

Não recomendo voto a ninguém.

Tenho o meu voto. E gostaria muito que o respeitassem. Quero apenas ser livre para escolher conforme minha consciência, sem patrulhamento religioso, sem ter que nadar neste mar de boataria em que se transformou o meio evangélico nestes dias.

"A falsa testemunha não ficará impune; e o que profere mentiras perecerá." Provérbios 19:9

João David Cavallazzi Mendonça
Florianópolis - SC